“O DIABO ESTEVE AQUI”: FEITIÇARIA, RELIGIOSIDADE POPULAR E AÇÃO INQUISITORIAL NA CAPITANIA DO RIO GRANDE (SÉC. XVIII)
Resumo
Nos últimos anos, a historiografia brasileira dos estudos inquisitoriais expandiu-se e consolidou-se como campo de estudo. As análises da documentação resultante das visitações inquisitoriais dos séculos XVI-XVIII fomentaram diferentes perspectivas de temas e abordagens. No entanto, a ação inquisitorial em outros espaços que não receberam efetivamente inquisidores vindos diretamente de Lisboa, ainda carece de maior investigação. O artigo tem como objetivo analisar os vestígios da ação inquisitorial na capitania do Rio Grande setecentista a fim de discutir a circulação social de elementos da religiosidade popular neste espaço. Para tanto, analisamos uma série de registros – denúncias e confissões apresentadas no Rio Grande aos representantes locais do Santo Ofício da Inquisição portuguesa – entre as décadas de 1740 e 1760, com o intuito de identificar as práticas mágico-religiosas associadas à feitiçaria registradas nos documentos inquisitoriais. Verificou-se que a circulação de práticas oriundas de diferentes matrizes culturais constituiu-se como uma característica expressiva da religiosidade popular no espaço colonial da capitania do Rio Grande, em que indígenas, negros e brancos recorriam a elementos do universo sobrenatural para a resolução das diversas demandas do cotidiano como, por exemplo, o uso de feitiços para a resolução de conflitos pessoais; a utilização de amuletos para autoproteção, como é o caso da utilização das bolsas de mandinga e dos patuás; bem como, a prática de feitiçarias divinatórias largamente utilizadas pelos diferentes grupos que compunham a sociedade colonial da segunda metade do século XVIII.